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sexta-feira, dezembro 30, 2005

Ônibus

Aquele tinha sido o mais enfadonho e cansativo dia de trabalho dos últimos tempos, e como escravo da minha própria rotina, nem mesmo à noite eu teria meu merecido descanso – tinha aula na universidade.
Estava exausto, caminhando pro ponto de ônibus, distraído com os meus pensamentos. É engraçado como nesses momentos você tem as idéias da sua vida, mas está cansado demais pra lembrar de alguma delas depois.
Na parada de ônibus, estavam uma dona-de-casa com um bebê, uma gostosona, um velho que tava “mais pra lá do quê pra cá” e eu. Era impossível não olhar pra aquela escultura de mulher – ainda mais no meu estado de “não como ninguém há um mês e não tenho ninguém no estepe!!!”. No começo da rua (que era um pouco longe da parada) vinha um ônibus que parecia ser o UNIVERSITÁRIO. Não dei tanta atenção, mas também não tinha muita certeza de qual era o nome certo, pois quando ele aproximou-se, o letreiro apresentava um maldito “BOA NOITE”. Preferi confiar na minha 1ª impressão, e continuei “secando” aquela gata (O que é?! Vem dizer que você não faria o mesmo??!!).
De repente, o ônibus chegou à parada e olhando pro letreiro na lateral eu li: UFAC. -“Meu Deus!!!! Não posso perder este!” - pensei, pois já tava atrasado, tinha prova e os “busões” que param mais próximos, me deixariam tão longe do meu bloco que eu teria que pegar um moto-táxi pra chegar até lá.
Arrisquei. Ao entrar no veículo, encontrei uma colega de curso e disparei logo a pergunta:
- Este aqui é o UFAC?
- É sim.
- Ufa!.. Podia jurar que era o Universitário...
- Agora que você falou fiquei em dúvida...
Achei que ela estivesse brincando e sentei entre um senhor de aparência serena e uma mulher que falava sozinha. Já de cara, identifiquei a mulher como sendo louca e resolvi tirar a minha dúvida com o senhor:
- Este aqui é o ônibus que vai pra UFAC?
Mas o cara nem me deu moral, mas “eu sou brasileiro e não desisto nunca” (ok, sei que esse bordão já foi mais que abusado em piadas) então eu perguntei novamente e com um tom de voz mais alto:
- Ô meu senhor, este aqui é o UFAC?
O velho virou mal-encarado pra minha direção, fechou o punho, e quando pensei que ele iria me agredir por conta de uma simples indagação, ele começou a gesticular. Passado o susto, percebi que se tratava de um surdo-mudo, e percebi também que eu não entendo porra nenhuma da linguagem deles.
Apelei pro cobrador:
- Ô moço... Qual ônibus é este aqui?
Ele poderia até me responder, se não tivesse colado num telefone celular. Nunca vi alguém falar tanto ao telefone... Mas eu insisti:
- O senhor pode me dizer qual ônibus é esse?
- Será que você não pode esperar um minuto?! – Respondeu com um tom impaciente, ainda o ouvi dizer pra outra pessoa ao telefone que “não era nada, só um mala-sem-alça...”.
Paguei a passagem e passei furioso pela roleta. O “busão” tava lotado. No meio de tanta gente, eu pensei que seria fácil conseguir o quê queria. Pra não dar uma incerta, procurei uma pessoa que estivesse com a aparência normal, que falasse e que não estivesse ocupada com um celular. Depois de uma pequena busca, avistei uma moça que se encaixava perfeitamente no perfil procurado. Abordei-a de maneira gentil pra evitar qualquer coisa:
- Oi. Você pode me dizer em qual ônibus nós estamos, por favor?
No exato momento que ela ia ceder essa preciosa informação, uma outra mulher deu um soco no rosto da minha informante e gritou:
- SUA CACHORRA, PUTA!!! VOCÊ NUNCA MAIS DÊ EM CIMA DO ALFREDO, SUA PIRANHA!!!
Mas o soco não ficou barato e as duas começaram a brigar igual a dois lutadores de vale-tudo. Aí é que eu não conseguia esclarecer a minha dúvida... O povo inteiro daquele ônibus voltou sua atenção pro “fight”, alguns separando as brigonas, outros torcendo por uma das duas...
Chegou ao momento em que o sangue subiu à cabeça e gritei mais que toda a multidão:
- ESSA DROGA DE ÔNIBUS É UFAC OU UNIVERSITÁRIO???!!!
Depois de um silêncio geral, uma voz fraca e tímida responde com certo temor:
- Esse aqui é o Tucumã.